Pular para o conteúdo principal

Postagens

Outonos

   Turva a mim a visão... Os sentido todos. O que vejo não vejo... É ilusão. Frutos podres que misturam-se aos bons. A macieira, de fronte a mim, prefere os bons frutos ao chão e aqueles, contrários a estes, junto a si. Eu sei que tu dirá: "Por que a faz?" Tal barbárie se dá porque o aroma das maçãs pútridas é muito mais intenso que o das sadias.    Houvera, outrora, quem a quisesse por terra. Preservei-a. A capacidade frutífera daquela macieira, que ora vemos, é tamanha que impressionaria a si própria. Eu a deposito minha confiança plena. Sim! minha confiança plena. "Por que? Não acabas por dizer que a predileção dela são os ventos maldosos?! Que te faz crer tanto nela?" tu dirás. Ela cativou-me. "Mas a ti todos cativam!" retrucará tu. O que transforma-nos em seres vivos pensantes é crer no melhor que há noutrem.    Soprou, outrora, por sobre ela intensa tempestade. Resistiu fortemente. Queres saber poque creio?! Veja-a com os olhos meus e entenderá.
Postagens recentes

Alma moribunda: parte II

O rapazola adiante, vendo que as anciãs tornavam ao templo e ciente da causa que as obrigava a tal, figura-se indiferente a tudo que sucede até o momento presente. Vira os quatro moribundos erguerem-se dos seus respectivos esquifes e tomarem rumos diferentes; ambos os defuntos - a exceção do garotinho que era inocente como o é um anjo - possuíam uma semelhança: a dor de serem traídos por seus semelhantes. Tal indiferença era única - e exclusivamente - porque conhecera o drama de cada um desses seres pútridos; sobretudo a do pequenino - cujo nome, de acordo com o rapazola, é João... Joãozinho como era chamado mais comumente. E a da moça cujo filho fora assassinado brutalmente. "A moça, aquela que fora abandonada pelo noivo..." conta ele. "Na antevéspera a seu casamento recebeu - do seu adorado (cujo nome dir-se-a: Narcíso) - um ramalhete de flores contendo o magnífico dente-de-leão e rosas amarelas lindíssimas; uma das velhas ali presente comenta que não é um bom p

Alma moribunda: parte I

Erguem-se dos leitos quatro moribundos; caminham ambos em direções opostas - onde vão? Não sei. As velhas alcoviteiras, residentes junto a antiga catedral, espantam-se; tamanho horror as consome: tentam correr na direção da igreja para rezarem pedindo pela remissão de todas as vezes nas quais falavam dos transeuntes nos arredores da cidade. Pobres anciãs... Não veem que já é tarde pra isso! Não, minto; sempre há tempo pra tal. Mas por que deixar somente pra quando algum ser ergue-se do seu esquife?! O primeiro pútrido ser - uma moça jovem, altiva; dum vigor que se faz notório mesmo após sua extinção - caminha rumo ao norte. Por que norte?! Ora! pois! porque é aí que reside seu noivo, digo, ex-noivo... "Ela fora noiva?!" dirás com espanto. Sim, fora. Mas essa foi sua desgraça (digo desgraça não pelo fato de casar-se) pois o moço, com o qual iria unir-se , abandonou-a ao pé do altar. "Mas que crápula!", dizes tu. Sim, foras deveras; a donzela não suportara taman

Ùltimo Pranto

Inda ontem recordei da tua outrora existência e... sinto muito. Fracassei! Cada novo dia é um tormento angustiante. Não sei o que aqui se passa. Me fazes muito falta. Eu sei: Já passara-se um longo período desde a tua partida, mas ainda me doí a alma. Falhei em outrora e agora falho novamente.  Pressinto que em breve nos encontraremos: Você está pronta? porque eu estou. Ninguém será avisado, não quero que interfiram. Eles não me entendem, não sabem a dor que me assola; era para ter sido a mim a quem o fim levaria e não a ti. Está sendo difícil suportar essa dor... Todos ao redor me dizem o óbvio: " Você tem que superar. " Falam como se fosse fácil. Se passassem pelo o que passo, não diriam uma estupidez tão grande!  Escrevo, mas sei que tu não lerás mais nada. Nenhum escrito provindo de um desgraçado, lhe trará algum proveito. Até mesmo a caneta me trai, falha tal como seu dono. Insiste em não gravar no papel palavras que ora escrevo. Compreendo-a muito bem. No

Sublime toque

   Viajara milhas para, enfim, vê-la; imensa alegria lhe encheu o peito.  Pensou ser ego, mas não, não era nem podia ser.  Não ouso dizer que fora amor porque creio ser uma palavra muito forte e, por tal nível, não deve ser utilizada levianamente.    Gostara-a  ao primeiro olhar, ao primeiro beijo - singular! - saboroso; se lês isso que ora narro saberá de quem trata.  "Oi, gatinha dos olhos de mel" disse ele com leve riso de canto de lábios.  Amistoso.  Charmoso.    Recordo que em outra ocasião ela perguntou-lhe: "Usas maquiagem?" e, após, tocou-lhe as faces.  Toque caloroso, macio...  A priori ele não entendeu.  Eu, no entanto, desde o princípio soube do que se tratava; e aqui, como sei que lerás, digo: "Foste muito esperta.  Eu em seu lugar teria feito o mesmo; mesma abordagem." Proclamo tal em alta voz tendo um riso saliente fixo ao rosto.    "Bela Helena, tenho profundo receio de machucar-te e machucar-me; em decorrência disso, não aches e

Nau

   Noite quente, estupidamente quente; nem mesmo a brisa, que outrora  soprava sobre mim, foi capaz de aplacar esse exaspero calor. tão quente... tão frio.    Ao longe vê-se uma grande nau a zarpar; mas aonde irá ela? Seu destino é incerto, tendo como única certeza que o porto no qual ela irá atracar não será o teu. Pobre marinheiro, tua barcaça segue a nau mas, ela segue apenas o curso outrora já traçado; ouso dizer ser em vão todo esse teu trabalho de seguí-la.    Iça-se a vela do mastro principal e tu, oh marinheiro, vais ficando (a cada onda marítima que passa) mais distante da tua adorada nau; não te afliges, oh marujo, porque tu bem sabes que o cruzeiro não tem porto fixo (ao contrário da nau). Modela-te   num ancoradouro permanente, quanto a nau deixa que siga; não te fases bem essa perseguição infundada.    Nau e cruzeiro estão agora lado a lado, vem aproximando-se uma grande tempestade; nau e cruzeiro afastam-se e seguem seus cursos. Pobre nau, pensou que o Cruze

Cometa

   Oh, simplória estrela, vem ao meu encontro. Minhas noites sem ti não são mais as mesmas; sinto falta da tua saudosa, e explendorosa, cabeleira loira, do olhar que me lançavas em meio as noites escuras, do teu riso resplandecente que me guiava por entre esses caminhos turvos e tristes (tortuosos)... Ah, que saudade sinto se ti!    Entende-me a mim, estrela minha; sem o teu brilho vigoroso meus passos são inseguros e, como consequência, não posso seguir na incerteza. Pena tu ter-se extinguido, ou fora que abandonei a ti?! Não sei. Não há como saber agora que fostes.    Ainda ontem sonhei contigo: estavamos, ambos, a correr em um campo coberto por alecrim, cujo aroma pairava no ar. Paramos. Trocamos olhares como cúmplices de um crime perfeito; em meio a este não consegui conter-me e roubei-te um beijo... Ah, estrela, este sonho fora tão real que pude sentir a maciez dos teus lábios nos meus.    Perdoe a mim, estrela, por expor esse desejo que tenho de ti neste pequeno e velho pergam